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Por que os cientistas acreditam que o SARS-CoV-2 COVID-19 teve origem nos morcegos e nos pangolins? - Exercício prático

Pangolim

Elaborado por Ricardo Koroiva - Professor Visitante do PPG em Ciências Biológicas - Zoologia da UFPB campus João Pessoa

Morcego

Médicos com roupas de proteção bacteriol

Seres Humanos

Olá...

 

que bom que você resolveu refazer as análises moleculares que auxiliaram Kristian G. Andersen, Andrew Rambaut, W. Ian Lipkin, Edward C. Holmes e Robert F. Garry a desenvolverem a hipótese de origem do RNA vírus SARS-CoV-2 COVID-19, desconsiderando que houve a manipulação em laboratório. Você não precisa instalar programas ou fazer o download de arquivos para fazer este exercício e dura menos de 10 minutos. Resultados similares foram publicados no artigo científico "The proximal origin of SARS-CoV-2" (algo como “A origem proximal do SARS-CoV-2”, em português) na revista Nature Medicine do dia 17 de março de 2020 e o usaremos como base.

artigo.jpg

Antes de começarmos, eu gostaria de deixar claro alguns importantes detalhes do “porquê” os cientistas estudaram e analisaram uma determinada região do RNA viral e de coronavírus de determinados animais para este estudo. Betacoronavírus são registrados para morcegos, pangolins, ratos, coelhos, camelos e diversos animais, como os seres humanos (se você não sabia, houve outras epidemias de coronavírus no mundo como a SARS-CoV, em 2002, e a MERS, em 2014; Clique e veja sobre SARS-CoV  e MERS).

  • Evidências indicam que as proteínas do SARS-CoV-2 COVID-19 parecem otimizadas para ligação ao receptor humano ACE2 e sua proteína Spike possui um local de clivagem funcional polibásico (furina) no limite S1 – S2 através da inserção de 12 nucleotídeos (levando a aquisição de três glicanos ligados ao O em torno do local), o que pode ser relacionado a proteção do determinante antigênico (algo ainda não confirmado pela ciência). O sitio de clivagem polibásica presente na proteína Spike permitiu, por exemplo, que os coronavírus da MERS infectassem células humanas de modo eficiente. Resumindo, a proteína Spike é importante para a capacidade de ação do vírus.

 

  • Como muitos casos iniciais de COVID-19 foram vinculados ao mercado de Hunan em Wuhan (China), é possível que uma fonte animal estivesse presente nesse local. Dada a semelhança do SARS-CoV-2 COVID-19 com outros coronavírus do tipo SARS-CoV, é provável que os morcegos serviram como hospedeiros. No entanto, outros coronavírus que infectaram os seres humanos geralmente passaram para hospedeiros intermediários (e.g. camelos na MERS) em vez do contato direto.

  • Zou e colaboradores (2020) demonstraram que o genoma do SARS-CoV-2 COVID-19 foi ~96% idêntico a um tipo de coronavírus de morcego (BatCoV RaTG13) e concluíram que a provável origem do vírus foram dos morcegos. Por outro lado, Zhang e colaboradores (2020) apresentaram que coronavírus isolados de pangolins possuíam até 91.02% de seus materiais genéticos idênticos ao genoma SARS-CoV-2 COVID-19, porém nas regiões da proteína Spike estes eram mais similares ao SARS-CoV-2 COVID-19 do que dos morcegos.

Visto estas informações, os autores compararam o genoma do SARS-CoV-2 COVID-19 com os genomas de SARS-CoV e dos betacoronavírus de morcegos e de pangolim, para tentar avaliar a possível origem. Os autores deram ênfase justamente a proteína Spike, visto sua importância para a infecção em humanos.

 

 Passo 1: Obtenção das sequências

  • Para comparar as sequências dos coronavírus temos que obtê-las. Em laboratório, cientistas sequenciaram o RNA de diversos coronavírus e depositaram no GenBank, o banco de dados de sequências genéticas gerido pelo o National Center for Biotechnology Information (NCBI) dos Estados Unidos.

 

  • Para obter as sequências basta acessar os registros de genomas depositados. Abaixo, segue os links de 5 genomas utilizados no artigo referência “The proximal origin of SARS-CoV-2”. Apenas o genoma do coronavírus de pangolim será utilizado de outra fonte para facilitar o acesso (o resultado será o mesmo).

Para facilitar as análises, eu forneço as sequências já traduzidas dos aminoácidos para o gene Spike nesta janela.

 

CLIQUE AQUI

 

Para copiar as sequências, clique e mantenha segurado o botão esquerdo do mouse no primeiro caracter das sequências, ">", do texto ">MN908947_CoV2....". Arraste o ponteiro selecionando até o último caracter, que será "T", do texto "...VKLHYT". Com as sequências selecionadas clique no botão direito do mouse sobre a seleção e clique em “Copiar” (ou aperte o famoso “ctr-c” nas sequências) (veja abaixo).

Seq14a.png
Seq14b.png
Seq14c.png

Segue os links dos genomas de 4 coronavírus de morcegos, 1 de coronavírus de pangolim, 1 da SARS-COV e 1 do novo SARS-CoV-2 COVID-19.

 

MN908947 – Coronavirus SARS-CoV-2 COVID-19 isolado de ser humano

MN996532 – Coronavirus isolado de morcego

MT084071 – Coronavirus isolado de pangolim

AY278741 – Coronavirus SARS-CoV isolado de ser humano

KY417146 – Coronavirus isolado de morcego

MK211376 – Coronavirus isolado de morcego

Caso você já tenha conhecimento prévio e programas de genética molecular, você pode baixar as sequências e fazer a tradução. Evidencio que iremos utilizar apenas a região do gene Spike, necessitando fazer o corte das sequências.

MAS VOCÊ PODE PERGUNTAR... TRADUÇÃO?

 

Bem, estamos falando do “Dogma central da Biologia Molecular”: DNA → RNA → Proteína.

 

Caso não se lembre, veja a aula da Profa. Nayara Tallita da UFG. Lembre que nosso estudo é com RNA vírus, logo, não tem a parte de transcrição do DNA e ele não é um retrovírus.

 

Caso ainda tenha dificuldades, veja a aula completa do Prof. Kennedy Ramos: SÍNTESE DE PROTEÍNAS - TRADUÇÃO - Código Genético - Parte 01 .

Passo 2: Alinhamento

 

  1. Com as sequências em mãos, realizaremos o alinhamento. Para isto será usado a plataforma do Instituto Europeu de Bioinformática (EBI) que faz parte do Laboratório Europeu de Biologia Molecular (EMBL), o principal laboratório da Europa para as ciências da vida.

https://www.ebi.ac.uk/Tools/msa/

(Clique aqui!)

2. Primeiro selecione o método de alinhamento. Neste caso, para nossa maior velocidade de alinhamento usaremos o software MAFFT (Katoh et al. 2002) (esta é uma adaptação do exercício).

 

Após acessar o site, clique em “Launch MAFFT”

Seq1.png

3. Selecione as condições para o alinhamento:

Step 1: Em “Enter or paste a set of” selecione “PROTEIN”.

Seq2.png

Step 2: Cole as sequências de aminoácidos. Clique o botão direito do seu mouse dentro da caixa de texto abaixo do escrito "sequences in any supported format" e clique na opção "colar".

Seq3.png

Step 3: No “Output format” selecione “ClustalW”

Seq4.png

Step 4: Clique em “Submit”

Seq5.png

AGUARDE O PROCESSAMENTO

Seq6.png
Seq7.png

Passo 3: Análise dos resultados.

1. Primeiro, clique em “Show Colors” para facilitar a visualização das diferenças.

Seq8.png

2. Observe o oitavo e o décimo segundo conjunto do alinhamento (oitavo e o décimo segundo bloco de cima para baixo).

Oitavo bloco

Seq9.png

Décimo segundo

bloco

Seq 9 e meio.png

3. Abra a Figura 1 do artigo “The proximal origin of SARS-CoV-2” e deixe aberta para fazer as comparações.

 

CLIQUE AQUI!!!

4. Compare os nossos alinhamentos e as regiões indicadas no estudo. Veja, tal como no estudo, como os aminoácidos destas importantes regiões são mais similares entre o “CoV2” e do Pangolim. Use o "Zoom", caso for necessário.

 

  • “Receptor-binding domain ACE2 contact residues” - RBD (algo como “Resíduos de contato com o domínio de ligação ao receptor ACE2 - RBD”) – Fiz esta linha preta para facilitar a sua visualização.

Seq10.png

“O-linked glycan residues” (algo como “Resíduos de glicanos O-ligados") – Fiz esta linha vermelha para facilitar a sua visualização.

Seq11.png

5. Apesar dos autores não utilizarem esta metodologia, observe a maior similaridade do gene Spike, em geral, do SARS-CoV-2 com o coronavírus de morcego do que do pangolim.

 

  • Suba a barra de rolagem até o início da página e clique em “Phylogenetic Tree”.

Seq12.png
  • Veja a maior similaridade de SARS-CoV-2 COVID-19 com a sequência de morcego do que a do pangolim. Coloquei a seta vermelha para facilitar a sua visualização da proximidade de Cov2 e morcego e a seta verde para indicar a sequência de pangolim.

Seq13.png
  • Assim, a presença de regiões chaves para infecção do SARS-CoV-2 COVID-19 mais similares ao coronavírus de pangolins pode significar que este animal foi o “hospedeiro intermediário” em algum momento. No entanto, em geral, o vírus é mais semelhante geneticamente ao encontrado em morcegos.

  • Apesar desta análise não ser o foco do artigo que usamos como base, o papel e a importância de pangolins e morcegos na evolução do SARS-CoV-2 COVID-19 ainda são incertos. Isto é discutido no artigo de Lam e colaboradores (2020) intitulado "Identifying SARS-CoV-2 related coronaviruses in Malayan pangolins" publicado dia 26 de Março de 2020 na revista Nature. Neste artigo os autores adicionam mais indícios do possível papel de "hospedeiro intermediário" do pangolim.

Lam et al 2020 fig.png

O fato do SARS-CoV-2 COVID 19 não ser próximo do coronavírus de uma exclusiva espécie indica que ele não teve uma origem única e direta de um destes animais. Esta evidência auxilia embasar o argumento que este vírus não foi "produzido em laboratório", pois necessitaria de um "vírus progenitor com similaridade genética muito alta". Outras evidências como o surgimento de glicanos O-ligados em sítios específicos serem relacionados ao envolvimento de um sistema imunológico humano (Bagdonaite & Wandall, 2008), também refutam a teoria de manipulação (outras mais podem ser averiguadas na discussão da correspondência). Deste modo, dois cenários são levantados para explicar de maneira plausível a origem do SARS-CoV-2 COVID 19 : (i) seleção natural em um hospedeiro animal antes da transferência zoonótica; e (ii) seleção natural em humanos após transferência zoonótica.

Até o momento (29 de Março de 2020), a passagem em morcegos e/ou pangolins durante a evolução do SARS-CoV-2 COVID 19  é o mais aceito. No entanto, como defende os autores do estudo, “mais dados científicos podem balançar evidências para favorecer uma hipótese [...]. Obter sequências virais relacionadas de fontes animais seria a maneira mais definitiva de revelar as origens virais”.

 

 

Espero que tenha gostado da prática! Cuide-se e cuide das outras pessoas!

 

Dr. Ricardo Koroiva

Professor Visitante

Programa de Pós Graduação em Ciências Biológicas (PPGCB) - Zoologia

Departamento de Sistématica e Ecologia (DSE)

Universidade Federl da Paraíba (UFPB) - campus João Pessoa

Obs: Caso tenha algum comentário ou queira sugerir alterações, envie email para ricardo.koroiva@gmail.com !

Obrigado pelo auxílio Vanessa Gomes, Diogo Vilela e Pedro Estrela!

Toda ajuda para melhorar será bem vinda! Obrigado!

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